O preço da gasolina e do diesel produzidos na antiga Refinaria Landulpho Alves (Rlam), em São Francisco do Conde (BA), subiu mais do que os vendidos pela Petrobras desde que a estatal transferiu a administração da planta de produção de combustíveis a uma empresa privada, a Acelen, em 1º de dezembro do ano passado.
De lá para cá, o preço da gasolina tipo A produzida na Rlam, hoje chamada de Refinaria Mataripe, subiu 7,40%. Neste mesmo período, a mesma gasolina vendida para as distribuidoras pela Petrobras subiu 1,85%.
Já o preço do diesel tipo S10, menos poluente, subiu 11,72% em postos de venda da Acelen em menos de dois meses. O diesel S500 aumentou 9,72%.
Por sua vez, a Petrobras reajustou os dois combustíveis em 7,93% e 8%, respectivamente, no mesmo período.
Preço por litro
Na última vez em que reajustou combustíveis vendidos a distribuidoras, no dia 12 deste mês, a Petrobras informou que passaria a vender gasolina a r$ 3,24 por litro e diesel a r$ 3,61 por litro, na média.
Já Acelen, empresa que assumiu a Rlam, vende o litro de gasolina por r$ 3,42 e do diesel por r$ 3,62, na média.
O preço dos combustíveis pode variar por conta de questões regionais de produção. Segundo a própria Acelen, no entanto, os percentuais de reajustes aplicados nesses preços estão vinculados à cotação do petróleo no mercado internacional e ao câmbio.
Esses dois fatores também influenciam os reajustes aplicados pela Petrobras, segundo sua política de paridade internacional de preços. Ainda assim, os aumentos em combustíveis vendidos pela estatal foram menores.
“O que estamos assistindo são as consequências da privatização”, analisou Deyvid Bacelar, coordenador geral da Frente Única dos Petroleiros (FUP) e diretor do Sindicato dos Petroleiros da Bahia (Sindipetro-BA).
“Por conta do monopólio regional privado [criado com a venda da Rlam], a Acelen promove no mercado baiano e nordestino o terceiro aumento de combustíveis em detrimento dos dois reajustes da Petrobras”, complementou.
Segundo Bacelar, o único motivo que faz a Acelen aumentar seus preços mais do que a Petrobras é a busca por maiores lucros.
“Estamos tratando com um fundo de investimentos dos Emirados Árabes, que trata de recursos do fundo soberano de Abu Dhabi. Então, o retorno tem que ser financeiro e imediato, custe o que custar. Se isso vai custar maiores preços para a população baiana e nordestina, isso não importa”, criticou.
A Acelen foi questionada pelo Brasil de Fato sobre a diferença nos reajustes aplicados pela companhia e pela Petrobras, mas não se pronunciou sobre o assunto. Em nota, a empresa declarou que sua “política de preço é independente, preserva a competividade e é amparada em critérios técnicos e transparentes”.
Aumentos ao consumidor
O preço da venda de combustíveis de refinarias às distribuidoras impacta diretamente no valor da gasolina ou diesel vendidos nos postos aos consumidores. No dia 12, quando a Petrobras aumentou o litro da gasolina em r$ 0,15, chegando a r$ 3,24, na média, a empresa estimou que isso aumentaria o preço do combustível nas bombas em cerca de R$ 0,11.
O aumento nas refinarias da Petrobras seria maior que nos postos, já que a gasolina vendida pela estatal é misturada a uma certa quantidade de etanol antes de ser vendida nas bombas. Sobre o preço do combustível comercializado pela estatal, ainda incidem impostos estaduais e federais, além do custo de revenda ao consumidor.
De acordo com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), na semana entre 9 e 15 de janeiro, a mesma em que a Petrobras anunciou o reajuste nos combustíveis, o litro da gasolina nos postos custava, em média, r$ 6,608 no país. Na semana seguinte, entre 16 e 22, esse mesmo litro de gasolina passou a custar, em média, r$ 6,664, representando um aumento de 0,84%.
Desde o início de dezembro, a Petrobras já reajustou duas vezes o preço da gasolina vendida às distribuidoras. Na primeira vez, no dia 15 daquele mês, a empresa reduziu o preço do combustível. Já no dia 12 de janeiro, aumentou.
Já a Acelen alterou sua tabela de preços da gasolina quatro vezes em menos de dois meses. Em 18 de dezembro, reduziu seus preços. Já nos dias 1º, 15 e 22 de janeiro, aumentou.
Privatização contestada
A Acelen é a empresa criada pelo fundo Mubadala Capital, dos Emirados Árabes Unidos, o qual comprou a antiga Rlam da Petrobras, em março de 2021.
A venda foi feita por r$ 1,65 bilhão de dólares, cerca de r$ 8,25 bilhões à época. Segundo avaliações do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis Zé Eduardo Dutra (Ineep), porém, a refinaria valia pelo menos o dobro disso.
A instituição elaborou três cenários para estabelecer o valor de mercado da Rlam. Nas três situações, a venda deveria ter sido feita por 3,12 bilhões de dólares, 3,52 bilhões de dólares ou 3,92 bilhões de dólares.
Uma denúncia sobre a venda chegou a ser feita pela Federação Única dos Petroleiros (FUP) ao Tribunal de Contas da União (TCU). O órgão não viu irregularidades no negócio.
A antiga Rlam é a primeira refinaria nacional. Foi criada em 1950, antes mesmo da fundação da Petrobras, em 1953.
A planta é capaz de produzir mais de 30 produtos diferentes, incluindo gasolina, diesel, lubrificantes e querosene de aviação. Também é produtora nacional de uma parafina usada na indústria de chocolates e chicletes.
Mais privatizações
A venda da Rlam faz parte do programa de desinvestimentos da Petrobras. Das 13 refinarias que a estatal tinha, oito foram postas à venda nesse programa. A Rlam foi a primeira cuja administração já foi transferida da estatal à iniciativa privada.
Oficialmente, a intenção do governo federal é vender as refinarias da Petrobras a outras companhias para que elas passem a concorrer com a estatal. Isso, para o governo, tende a reduzir o preço dos combustíveis no Brasil.
Para Bacelar, da FUP, o caso da Rlam demonstra que esse tipo de política de privatização não reduz preços.
“A grande falácia era: ‘Vamos vender metade da capacidade de refino da Petrobras no Brasil para a gente aumentar o número de players, ter concorrência estabelecida e reduzir o preço dos combustíveis’. Agora, na Bahia, temos uma refinaria vendida em que os preços não baixaram. Muito pelo contrário. Estão maiores que os preços praticados pela Petrobras.
A Petrobras foi procurada para comentar sua política de preços de combustíveis, mas não respondeu à reportagem.
Edição: Rodrigo Durão Coelho