O coordenador-geral da Federação Única dos Petroleiros (FUP), João Antônio de Moraes reafirmou na audiência na Comissão de Assuntos Sociais do Senado, presidida pelo senador Paulo Paim (PT-RS), a relevância do pré-sal como patrimônio estratégico para o desenvolvimento nacional. Abaixo, a íntegra da intervenção do líder petroleiro, publicada no jornal Hora do Povo. www.horadopovo.com.br
“Leiloar o pré-sal é abrir mão da redenção social do país”
Nenhuma classe social pode ter os seus direitos respeitados sem que o país se desenvolva ou cresça. Para nós, trabalhadores, os nossos interesses caminham diretamente ligados aos interesses do nosso país. Portanto, qualquer trabalhador, qualquer sindicato, qualquer organização que imaginar que é possível defender os direitos dos trabalhadores sem um olhar estratégico para o crescimento da Nação, para o desenvolvimento como um todo do País, estará cometendo um grande equívoco. Nós, organizados na Federação Única dos Petroleiros, olhamos o País como um todo. Melhores condições de trabalho e desenvolvimento da cadeia produtiva são absolutamente fundamentais – e não será com a privatização, nós estamos convictos, que isso será possível.
Temos hoje, segundo dados do Sinaval, sindicato patronal da construção naval no país, cerca de 52 navios petroleiros encomendados no Brasil, principalmente a partir da mudança de política da Petrobrás – a partir de 2003, porque, até então, não tínhamos nenhum navio encomendado.
O Brasil já foi o segundo armador do mundo. Mas, em 2002, nós tínhamos dois mil trabalhadores nos estaleiros brasileiros: só tínhamos os vigilantes tomando conta do mato, que tomava conta dos nossos estaleiros.
A partir de 2003, com a mudança governamental, com a Petrobrás encomendando navios no Brasil, mudou completamente o quadro dos estaleiros brasileiros.
Mas, das 50 empresas presentes em nosso País no setor do petróleo, 30 delas operadoras, 49 dos 52 navios são encomendados pela Petrobrás.
Poderíamos perguntar: e esses outros três, quem encomendou?
Esses outros três navios são encomendados pela PDVSA.
A PDVSA, do Chávez, aquele monstro que muitos pintam pelo país afora, é que fez as únicas três encomendas, que não são da Petrobrás, aos nossos estaleiros.
Não há uma única encomenda dessas operadoras privadas que entraram no país a partir dos leilões.
Empregos em plataforma, em refinaria, em terminal, são altamente especializados – e em número muito pequeno. Onde é que está o desenvolvimento e a renda?
O desenvolvimento e a renda estão na cadeia produtiva – antes e depois. Os metalúrgicos, fabricando os nossos navios, os químicos, produzindo os derivados plásticos na petroquímica – lá estão os empregos e a renda.
Nós temos, na região do ABC paulista, cerca de 20 mil trabalhadores envolvidos na cadeia produtiva do petróleo, entre petroquímica, derivados plásticos e tudo o mais. Nós temos no petróleo e na refinaria cerca de 1,5 mil trabalhadores. Então, é na ponta da cadeia que há o emprego e a renda.
Produzir petróleo e exportar é inútil para o desenvolvimento nacional – seria mais uma exaustão dos nossos recursos naturais.
Se isso já aconteceu de maneira equivocada em outros momentos, com o petróleo e gás seria ainda mais grave. O petróleo do pré-sal, que o presidente Lula apontava como um bilhete premiado, e alguns faziam chacota, cada vez mais se confirma o quanto, de fato, o peão metalúrgico estava certo – enquanto muitos doutores estavam equivocados. Do petróleo do pré-sal, cada vez mais se confirma não só a existência, mas a qualidade. Eu digo com muita tranquilidade: é a maior descoberta petrolífera dos últimos 30 anos.
A maior, se usarmos para o nosso povo; se colocarmos o pré-sal à disposição dos sugadores de energia do planeta, não vai dar para nada, porque eles consomem esse petróleo de uma maneira muito rápida – um americano consome seis, sete vezes mais energia que um brasileiro. E consomem dez vezes mais petróleo, para movimentar a sua máquina de guerra.
Outros países já se iludiram com isso. Então, o pré-sal pode significar a redenção nacional, se a sua exploração for voltada para os nossos interesses; se for voltada para exportação, não vai dar para nada.
Nós temos, na Petrobrás, cerca de 85 mil trabalhadores próprios e cerca de 360 mil trabalhadores terceirizados – os dados são da empresa.
Com muito orgulho, nós dizemos que as condições de trabalho dos trabalhadores da Petrobrás só têm como paralelo no mundo os trabalhadores da Statoil – na Noruega, porque aqui no Brasil a Statoil atua como uma empresa privada qualquer, ela tem cerca de 200 trabalhadores próprios e 500 trabalhadores terceirizados. Esses trabalhadores próprios são basicamente trabalhadores administrativos dos escritórios; nas plataformas, nas áreas produtivas, não há trabalhadores próprios, são todos terceirizados.
A mesma coisa a Shell, que é ainda é pior – até porque não divulga os dados, ao contrário da Statoil, que ainda tem um pouquinho de transparência: a Shell tem cerca de 700 trabalhadores, e mistura tudo nos seus dados, colocando trabalhadores das plataformas com trabalhadores do comércio de petróleo, de derivados, misturando comerciários com petroleiros. Uma confusão, mas, pelos dados de companheiros dos sindicatos-irmãos, desses 700 trabalhadores da Shell, não há trabalhadores próprios nas plataformas – e quem conhece um pouco das condições de trabalho no nosso país sabe o quanto terceirizar é precarizar.
A OGX, do sr. Eike Batista, a mesma coisa: apenas 350 trabalhadores próprios, e, todos, trabalhadores administrativos. As plataformas são todas subcontratadas, terceirizadas.
Então, qual o resumo que a gente faz do que significaram os 11 leilões para as condições de trabalho no país?
Terceirização ainda maior que a da Petrobrás, que nós já consideramos um completo equívoco; jornada de trabalho maior do que as jornadas praticadas pela Petrobrás; sem negociação coletiva, ou, quando existe, com o sindicato cartorial. Qualquer um pode acessar, na internet, a página do Sinditob [Sindicato dos Trabalhadores Offshore do Brasil], que é um sindicato criado pelas empresas, é um sindicato de trabalhadores criado pelas empresas de petróleo. Qualquer um que olhar a página, vai ver que não é página de sindicato de trabalhadores. Realmente, é um sindicato patronal com o qual a maior parte das empresas “negocia”.
Falta transparência na divulgação dos resultados, falta desenvolvimento da cadeia produtiva. Nenhuma dessas empresas se propõe a construir uma refinaria em nosso país, nenhuma delas. Dizia-se muito que a “abertura” viria para construir refinarias. Nós ficamos 30 anos sem construir uma refinaria e só passamos a construir depois de uma mudança política, de governo, porque, se depender das empresas que estão entrando no país, não sai refinaria, muito menos cadeia produtiva.
Precisamos desenvolver a cadeia produtiva como um todo, exigindo melhores condições de trabalho, atualizando a Lei nº 5.811, de 1972, a lei que rege as condições de trabalho do setor – porque as empresas privadas também não cumprem essa lei – e, principalmente, não podemos permitir uma política industrial para esse setor calcada na exportação de petróleo in natura.
Não permitiremos que um recurso como o pré-sal, que a natureza levou 130 milhões de anos para construir, repita a tragédia de outros recursos, como o pau-brasil, o ouro, o ferro. Essa é a grande questão sobre a qual nós, brasileiros, temos que nos debruçar. O petróleo do pré-sal vai ser para a redenção nacional ou o petróleo do pré-sal vai ser como foi o ouro? Não sei se todos sabem, mas o Brasil chegou a produzir, em um só ano, três vezes todo o ouro produzido no resto do Planeta. O que ficou para o nosso País desse ouro?