Crime da Vale é tema de plenária da Frente Brasil Popular no Sindipetro/MG Crime da Vale é tema de plenária da Frente Brasil Popular no Sindipetro/MG

Diversos, Notícias, Tribuna Livre | 29 de janeiro de 2019


Uma grande plenária organizada pela Frente Brasil Popular (FBP) debateu na noite de segunda-feira (29) o crime da Vale em Brumadinho, na região metropolitana de Belo Horizonte. O evento aconteceu na sede do Sindipetro/MG e reuniu parlamentares, representantes de diversos movimentos sociais e sindicatos, integrantes da Frente Povo Sem Medo, petroleiros e trabalhadores de diversas categorias.

Em todas as falas um único sentimento: dor e revolta por Minas Gerais estar revivendo oque ocorreu há três anos em Mariana (MG), quando a barragem de Fundão se rompeu deixando 19 mortos e sepultando o rio Doce. “É ainda difícil de entender e acreditar que isso aconteceu de novo. E quando aconteceu em Mariana, não se discutia se isso aconteceria de novo, mas quando iria ocorrer”, afirmou a integrante do MAM, Maria Júlia Andrade.

Ela suscitou o debate sobre o modelo de mineração que é praticado hoje, um modelo primário exportador que visa a extração e venda do minério da forma mais rápida possível para se expandir o lucro das mineradoras. Além disso, ela destacou que mesmo com tudo que a tragédia de Mariana provocou ao povo mineiro e ao Rio Doce, a Vale continuou apresentando lucros recordes trimestre após trimestre.

O dado mais recente, referente ao último trimestre de 2018, aponta que a Vale obteve lucro líquido atribuído aos acionistas de R$ 5,753 bilhões. O valor representou uma alta de 1.780% em relação ao resultado de R$ 306 milhões obtido nos três meses anteriores e era ainda menor do que o lucro registrado no mesmo período de 2017, que foi de R$ 7,1 bilhão. Enquanto isso, os atingidos pela barragem de Mariana seguem sem casa, como bem lembrou o integrante da coordenação nacional do MAB, Joceli Andrioli. “Já se passaram três anos e até hoje não há uma única família reassentada em Bento Rodrigues”, afirmou.

Ainda durante a plenária, foram apresentadas diversas denúncias acerca da atuação da Vale no Estado. O deputado federal eleito Rogério Correia (PT) lembrou que, após o crime de Mariana foi criada uma Comissão Extraordinária das Barragens na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), da qual ele foi relator na época. Segundo o parlamentar, essa investigação apontou diversas irregularidades na atuação da mineradora no Estado, mas nenhum dirigente da empresa sequer foi preso.

“O relatório apontou que já se sabiam de vazamentos e rachaduras na barragem de Fundão, mas ainda assim a Vale e a BHP Billiton [controladoras da Samarco – responsável pela barragem de Fundão, em Mariana] foram capazes desse crime. E nesse mesmo relatório já se apontavam os riscos que o rompimento da barragem de Brumadinho e outra barragem localizada próximo do Rio das Velhas representavam para o abastecimento de água na região metropolitana de Belo Horizonte”.

A queda de Fundão também suscitou projetos de lei na Assembleia, mas nenhum deles foi aprovado. Um (Projeto de Lei 3.677/16) trata do endurecimento das regras para o licenciamento de barragens de rejeitos no Estado, sob pena de multas e e outras punições. Ele foi proposto pela Comissão Extraordinária das Barragens a partir do projeto Mar de Lama Nunca Mais – projeto de de iniciativa popular elaborado pelo Ministério Público e representantes das famílias atingidas. Outro (Projeto de Lei 3.312/16) trata da instituição da Política Estadual dos Atingidos por Barragens (Peabe).

CPI da Mineração

Ainda em 2015, parlamentares mineiros propuseram a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Mineração em Minas. Entretanto, a proposta nasceu morta pois, segundo os parlamentares presentes na plenária da Frente Brasil Popular, o lobby das mineradoras na Assembleia impediu o avanço da medida.

Foto: Thainá Nogueira

Entretanto, essa proposta ressurgiu agora diante da reincidência da Vale em crimes envolvendo barragens. Dessa vez, ainda não é possível calcular o dano ambiental pois não se sabe até onde a lama de rejeitos caminhará, mas existe possibilidade de que chegue à represa de Três Marias e ao rio São Francisco – um dos mais importantes cursos d’água do Brasil e responsável pelo sustento de centenas de famílias no norte de Minas e nordeste do País.

Mas, já é sabido que o número de vítimas dessa tragédia é muito maior que o crime de Mariana e talvez seja o maior acidente de trabalho registrado no Brasil nos últimos anos. Até esta terça-feira (29), o número de corpos retirados da lama já chegava a 65 e outras 279 pessoas continuavam desaparecidas.

“Estamos atrasados pois essa CPI era pra ter ocorrido em dezembro de 2015. Não fizemos naquela época, então que façamos agora”, disse a deputada estadual eleita, Beatriz Cerqueira. E emendou: “Convoco a todos para que façamos uma grande pressão junto ao Legislativo mineiro no dia 1° de fevereiro, quando serão empossados os novos deputados estaduais em Minas. Chega de crime em nosso Estado”.

O deputado federal Rogério Correia também afirmou que irá propor uma Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI) na Câmara dos Deputados, em Brasília.

Mobilização

Outro tema que foi muito abordado na plenária foi a necessidade de mobilização popular para que haja mudança no modelo de mineração do Estado. “Hoje vivemos um projeto de sociedade onde a vida não tem valor. Sou da cidade de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, e ao visitar Brumadinho nesta segunda-feira, me lembrei da tragédia da Boate Kiss, que completou seis anos hoje e onde 242 jovens morreram e mais de 600 ficaram feridos. Ninguém foi punido. E, mesmo depois de tudo que aconteceu em Santa Maria ou em Mariana, não conseguimos mudar nada em relação à impunidade nesse País. Então eu pergunto: que tipo de sociedade queremos construir?”, disse o deputado federal pelo Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta (PT).

Maria Júlia Andrade também alertou sobre a importância da organização popular como forma de fazer frente à impunidade e ao modelo explorador de riquezas sob o qual se encontra a Vale. “Hoje, temos um Estado subordinado à mineração. Então, se o povo organizado não se organizar ainda mais, não só não conseguiremos mudar essa realidade como isso que aconteceu em Brumadinho e Mariana vai acontecer de novo.

Uma das propostas de organização apresentadas na plenária foi um agenda de atos de rua. Entre eles, uma reunião pública que acontecerá nesta terça-feira, às 17 horas, na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Além disso, estão previstos atos para o dia 31 de janeiro, quando a tragédia de Brumadinho completa 7 dias, e uma manifestação em frente à Assembleia no dia 1° de fevereiro – dia da posse dos deputados eleitos. Também foram discutidas mobilizações para marcar a data de um mês do crime e proposta a criação do

Foto: Thainá Nogueira

Dia Nacional de Luta Contra as Privatizações, no dia 6 de maio, quando completam-se 22 anos da venda da Vale para a iniciativa privada.

Participações

A plenária foi conduzida por Bernadete Monteiro, da Marcha Mundial das Mulheres, e Sílvio Neto, do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) – ambas organizações que compõem a Frente Brasil Popular em Minas. Participaram da mesa a deputada estadual, Beatriz Cerqueira (PT), o deputado federal pelo Rio Grande do Sul, Paulo Pimenta (PT), o integrante do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), Joceli Andrioli, e a representante do Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Maria Júlia Andrade.

Também estiveram presentes o vereador de Belo Horizonte, Arnaldo Godoy, as deputadas estaduais Leninha (PT) e Marília Campos (PT) e o deputado Marquinho Lemos (PT). Também acompanharam a plenária a deputada federal Margarida Salomão (PT) e os deputados federais por Minas, Rogério Correia (PT) e Reginaldo Lopes (PT), além dos ex-deputados Patrus Ananias (PT) e Jô Moraes (PCdoB).

A proposta da plenária era nivelar as informações sobre o que aconteceu em Brumadinho a partir da experiência de representantes dos movimentos sociais na região, especialmente o MAB e o MAM. Mas, também tinha como objetivo apontar os desafios colocados a partir da tragédia e traçar um plano de lutas para tentar inverter a lógica do lucro acima de qualquer coisa que impera na mineração no Estado.

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