Novo aumento do gás. Poderia ser diferente? Novo aumento do gás. Poderia ser diferente?

Diversos, Notícias | 15 de junho de 2021

Em meio a crise do coronavírus, do aumento da fome e do desemprego, o povo brasileiro sofre com o abandono do governo Bolsonaro e da Petrobrás. Com mais um aumento no preço do gás de cozinha, a população da Região Metropolitana de Belo Horizonte já está pagando mais de R$100,00 por uma botija de 13Kg.

Realizada entre os dias 5 e 10 de junho, a pesquisa do Mercado Mineiro constatou que o botijão de 13kg, se comparado com janeiro de 2021, está 9% mais caro na capital mineira.

O aumento é reflexo da política econômica do governo Bolsonaro, e endossado pela atual gestão da Petrobrás que, para engordar os bolsos dos acionistas, joga o povo brasileira à fome. Confira abaixo reportagem especial do Sindipetro-SP sobre a atual política de preços.

Existem alternativas para a atual política de preços dos combustíveis?

Por Vítor Peruch, especial para o Sindipetro-SP | Edição: Guilherme Weimann

Ampliação do parque de refino e subsídio cruzado são apontados como possibilidades para amenizar volatilidade dos preços

Menos de dois meses após o impeachment da ex-presidenta Dilma Rousseff (PT), o então presidente da Petrobrás, Pedro Parente – conhecido como o ‘ministro do apagão’ do setor elétrico, ocorrido em 2001 – decidiu implementar uma política que seria um divisor de águas no mercado nacional de combustíveis.

A partir do dia 14 de outubro de 2016, as refinarias da estatal passaram a definir os valores dos derivados por meio do preço de paridade de importação (PPI), o que gerou, desde então, aumentos de 50% do diesel, 54,6% da gasolina e 53,5% do gás de cozinha (GLP) para os consumidores finais, de acordo com dados da Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).

De um lado, setores do mercado financeiro – apoiados pelo discurso quase uníssono da grande mídia – defendem o PPI como medida fundamental para manter a sustentabilidade econômica da companhia. Do outro, caminhoneiros, petroleiros, trabalhadores de aplicativos e grande parte da população que enche o tanque do carro criticam a escalada de preços – incluindo dos alimentos, que são influenciados pelo custo do frete.

Mas, afinal, o PPI é a única forma de cálculo para definir os preços dos derivados nas refinarias da Petrobrás? Existem alternativas? Como o Brasil pode lidar com a flutuação constante dos preços dos combustíveis? E, mais do que isso, quem lucra com a atual política de preços? Estas são algumas das perguntas que a reportagem buscou responder.

O que é PPI?

O PPI é um método regulatório que fundamenta o preço dos derivados tomando como base o cenário internacional. Ou seja, se o Brasil não produzisse combustíveis e tivesse que importá-los, qual seria esse custo? Diante dessa premissa, o PPI leva em conta três importantes definidores: o preço do barril do petróleo no mercado internacional; a cotação do dólar; e os supostos custos de importação (carregamento dos navios, frete, taxas portuárias, entre outros).

Desde então, os preços domésticos dos derivados estão à deriva das oscilações do mercado internacional, seja pelos valores, como também pela frequência dessas flutuações.

Em um período de desvalorização cambial e elevação do barril no mercado internacional, como ocorreu nos anos de 2017 e 2018, o PPI provocou reajustes significativos nos preços dos derivados. Além disso, essa política abriu espaço para os importadores de combustíveis.

PPI para quem?

Um país que apenas importa petróleo e seus derivados é obrigado a adotar medidas regulatórias que se aproximam do PPI, pois tem que se submeter ao preço do barril no mercado internacional. Mas, se o Brasil produz seu próprio petróleo e possui potencial para ser autossuficiente nos derivados, por que o preço é baseado nas variações internacionais?

A resposta é baseada no que acionistas e importadores privados que foram incorporados à dinâmica da cadeia acreditam, como explica Carla Ferreira, pesquisadora do Instituto de Estudos Estratégicos de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (Ineep).

“A partir da gestão Pedro Parente, tivemos uma dinâmica de subutilização das refinarias que permitiu um avanço na entrada de importadores no mercado brasileiro. A partir do momento que este player se expande e vira um ator importante nessa dinâmica de disputa dos preços, eles também serão um elemento de pressão para que se mantenha o PPI, já que eles, sim, estão importando e estão submetidos ao preço internacional, diferentemente da Petrobrás que produz petróleo aqui, tem um custo de extração muito mais baixo que o preço internacional e teria capacidade de manter  um preço interno menor, através de uma política de preço diferente”, aponta a pesquisadora.

Além dos importadores, existe também a pressão interna por parte dos acionistas, visando a maximização dos lucros da empresa no curto prazo. “A visão dos acionistas é de uma maximização do lucro. Se conseguimos extrair petróleo a preços menores que o valor internacional, os acionistas acreditam que quanto maiores os preços, maiores os ganhos”, afirma Ferreira.

Estratégia para privatizar 

Além de visar a maximização dos lucros e ignorar a importância da função social da estatal, existem interesses privados para o PPI ser adotado e defendido por alguns setores.

“Para que a refinaria atraia compradores, o setor privado tem que visualizar lucros no longo prazo. À medida que deixamos o preço em paridade com o mercado internacional, estamos garantindo que os compradores vão vender um produto a um preço elevado, maximizando os lucros”, comenta Ferreira, que defende outras alternativas para a composição do preço dos derivados.

Subterfúgios à ineficiência

Para conter a alta dos preços, gerada principalmente pela metodologia do PPI, o governo federal anunciou medidas que se mostraram ineficientes e o preço do combustível não baixou.

A principal delas foi um decreto e uma medida provisória que zeraram as alíquotas de cobrança de impostos federais para o gás de cozinha e o PIS/Cofins para o diesel. Além disso, naquele momento, o presidente passou a cobrar publicamente os governadores para zerar o ICMS, afirmando que isso reduziria o preço dos derivados para a população.

Entretanto, como a composição do preço é realizada pela realização da Petrobrás, pelo CIDE e PIS/FASEP e COFINS, pelo ICMS, e pelo custo do biodiesel e a margem da distribuição e revenda, zerar estes impostos não gerou o impacto esperado pela população.

Se não tivermos a estruturação de uma política pública que leve em conta todos os elementos da cadeia, as reduções de apenas uma parte dos componentes não fará com que o preço diminua para o consumidor final

CARLA FERREIRA, INEEP

“O governo federal escolheu o tributo como vilão na tentativa de retirar sua responsabilidade de entender a dinâmica envolvendo todos estes atores. No último período, o principal componente responsável pelo aumento dos preços tem sido a realização da Petrobrás por conta da dinâmica do PPI. Não basta zerar outros componentes e não olhar para o macro”, opina Ferreira.

Enquanto o tributo foi reduzido, houve aumentos nos outros fatores, mostrando total ineficiência nesta política adotada, que serviu como uma cortina de fumaça para o real problema: a simples adoção do PPI sem nenhuma política pública efetiva atrelada.

Sobre isso, a pesquisadora é enfática: “Se não tivermos a estruturação de uma política pública que leve em conta todos os elementos da cadeia, as reduções de apenas uma parte dos componentes não fará com que o preço diminua para o consumidor final”.

Quais são as alternativas para o PPI?

Não faltam alternativas mais eficientes ao PPI, de acordo com pesquisadores do setor. Entre elas, algumas políticas públicas que atualmente são ignoradas, como, por exemplo, a adoção de bandas de preços e de impostos flutuantes com variações de alíquota a partir do valor internacional do barril.

Neste último modelo, quando o preço está muito alto, a alíquota da CIDE é reduzida. Quando o preço está baixo, a alíquota é elevada e a arrecadação é destinada para contribuir com uma reposição nos momentos de preço alto.

Outra alternativa seria a utilização de uma espécie de banda de preço. Carla Ferreira explica como funcionaria: “Você estabelece um valor mínimo e máximo de reajuste e controla internamente o que entra neste reajuste. Com isso, você organizaria o preço interno de uma forma que não passe a volatilidade do mercado internacional para o mercado interno”.

Todavia, para que isso ocorra, é necessário recursos fiscais que deem conta desta dinâmica. Ou seja, o país teria que alinhar essa proposta à criação de um fundo soberano que pudesse dispor recursos em momentos que não se repassa todo reajuste externo para o mercado interno.

Ampliação do refino e subsídio cruzado

Cibele Vieira, diretora da Federação Única dos Petroleiros (FUP) e do Sindicato Unificado dos Petroleiros do Estado de São Paulo (Sindipetro-SP), aponta outros fatores que seriam fundamentais para que o Brasil conseguisse diminuir o valor de seus derivados para o consumidor final. A primeira delas seria a utilização de subsídios cruzados, já que a Petrobrás é uma empresa integrada e obtém lucros de distintos setores como a exploração, refino, distribuição e as termoelétricas.

“Em algumas épocas, o preço de derivados no Brasil estava abaixo do internacional e em outras estava acima. Com isso, você amortecia a oscilação, tornava o setor mais estável”, afirma Vieira.

A Petrobrás poderia fazer uma política de preço de derivados até mesmo sem lucro, pois ela é uma empresa integrada. Ela pode ter um lucro maior na exploração de petróleo, quando este estiver alto, e não obter lucro no refino, mesmo assim mantendo-se uma empresa lucrativa

CIBELE VIERA, DIRETORA DA FUP E DO SINDIPETRO-SP

Ela ainda indica o caminho para este amortecimento: “a Petrobrás poderia fazer uma política de preço de derivados até mesmo sem lucro, pois ela é uma empresa integrada. Ela pode ter um lucro maior na exploração de petróleo, quando este estiver alto, e não obter lucro no refino, mesmo assim mantendo-se uma empresa lucrativa. Quando o preço do petróleo cai, ela pode ter menos lucro na exploração e mais lucro na venda de derivados. Uma coisa compensa a outra. Por ser uma empresa integrada, ela poderia realizar um subsídio cruzado. Neste momento, o que é feito é a segmentação e a busca pela maximização dos lucros em todos os setores”, explica a petroleira.

Mas, de acordo com a diretora da FUP e do Sindipetro-SP, neste momento, o que seria fundamental e vem sendo ignorado pelo governo federal é a ampliação dos parques de refino.

“A FUP defende investimentos na ampliação do parque do refino, pois ainda não damos conta da produção nacional de diesel, por exemplo. Apesar de ser apenas uma parte, se você aumentar a produção nacional, não seria necessário essas importações. Se tivéssemos concluído a refinaria de Abreu e Lima, por exemplo, já seria suficiente para isso. Temos que aumentar a capacidade de refino das refinarias atuais e construir as refinarias previstas“, afirma Vieira.

Desta forma, a regulação atua em diversos cenários econômicos, mas é fortemente evidenciada em períodos de alta do preço do barril de petróleo, sendo um dos alicerces das estratégias políticas de diversos países. As nações adotam diferentes mecanismos, tendo como fio condutor o debate fundamental da regulamentação estatal em favorecimento dos interesses sociais.

Diante disso, refinarias e empresas de energia se confrontam com distintos interesses e interessados. De uma cadeia que começa pelos produtores, passa por importadores, empresas de matéria-prima, transportadores e outros prestadores de serviços envolvidos nesta cadeia, até chegar aos consumidores finais.

Cada país tem a responsabilidade de reagir aos estímulos internacionais protegendo sua economia e, no cenário brasileiro, o petróleo segue sendo a matriz energética essencial, tendo uma posição consolidada por meio da Petrobrás.

No cenário atual, a estatal privilegia seus acionistas em detrimento do abastecimento da população e ignora qualquer política pública efetiva, como um fundo soberano, impostos flutuantes, subsídios cruzados e bandas de preços.

Isso ocorre devido à pressão dos acionistas e de importadores privados que estão cada vez mais estabelecidos em nosso mercado interno, além de visar atrair investidores garantindo preços elevados e lucros maximizados.

Escolher um vilão e não analisar o panorama geral é apenas uma cortina de fumaça para conter o descontentamento e inflar apoiadores, tática já observada outras vezes pelo governo federal.

Projetos de lei

As alternativas são muitas e se faz necessária a ampliação do debate e a formulação de políticas públicas que estejam atreladas não só ao interesse de acionistas e potenciais compradores, mas também da população brasileira que é extremamente dependente do modal rodoviário e sempre a mais afetada pela política de preço de importação vigente na atualidade.

Em abril deste ano, o Senador Rogério Carvalho (PT/SE) protocolou um projeto de lei propondo mudanças na política de preços dos combustíveis. O deputado Mário Heringer (PDT/MG) também já havia proposto uma iniciativa similar na Câmara dos Deputados.

O projeto busca a implementação de um imposto de exportação que financie um fundo de compensação que seria utilizado para reduzir a volatilidade do valor dos derivados e reforça a necessidade dos preços de realização dos produtos levarem em conta os custos internos de refino e não o preço internacional. De acordo com o Ineep, essas duas medidas são imprescindíveis para evitar o aumento dos derivados para a população brasileira.