Bolsonaro usa fertilizantes como desculpa para aprovar mineração em terras indígenas Bolsonaro usa fertilizantes como desculpa para aprovar mineração em terras indígenas

Diversos, Notícias, Tribuna Livre | 28 de março de 2022

Em meio à crise dos insumos, presidente se utiliza de informações enganosas para defender aprovação do PL 191, que libera mineração em áreas demarcadas


por Andreza de Oliveira | Unificado-SP

Sob a justificativa de diminuir a dependência da importação de fertilizantes, o presidente da República defendeu a mineração em terras indígenas ao lançar o PNF (Foto: Marcelo Camargo/ Agência Brasil)

 

No início de março, a Câmara dos Deputados aprovou urgência para a votação do Projeto de Lei 191, que libera a mineração em terras indígenas. O processo acelera a tramitação da proposta, que não precisará mais passar por comissões temáticas e deve ir a plenário entre 12 e 14 de abril.

Somado a isso, na mesma semana, o governo federal lançou o Plano Nacional de Fertilizantes (PNF) – projeto que pretende garantir a exploração e produção do setor até 2050. O anúncio ocorreu em meio à crise provocada pela guerra entre Ucrânia e Rússia, este último, o principal fornecedor de fertilizantes para o Brasil.

Para o diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), Gerson Castellano, o PNF também ameaça os indígenas porque pode facilitar a mineração em terras demarcadas. “É extremamente preocupante, o risco nessas localidades é alto porque esses povos originários ficam expostos a doenças, exploração e todo o mal do extrativismo”, explica.

Lançado sob a justificativa de diminuir a dependência do mercado internacional, o PNF escancara a contradição do governo que, do outro lado, tem desmontado a Petrobrás e colocado à venda ativos como a Unidade de Fertilizantes Nitrogenados (UFN3), no Mato Grosso do Sul,  e as Fábricas de Fertilizantes Nitrogenados (Fafen) na Bahia, Sergipe e Paraná.

Durante o lançamento do PNF, em março, o presidente da República, Jair Bolsonaro (PL) defendeu a mineração em terras demarcadas e, uma semana antes, já havia relacionado a aprovação do PL 191 à necessidade do país em produzir fertilizantes. “Eu espero que seja aprovado na Câmara agora para que, daqui a dois ou três anos, possamos dizer que não somos mais dependentes de importação”, afirmou Bolsonaro, com a justificativa de que as reservas de potássio estão nas aldeias localizadas na Bacia do Amazonas.

Entretanto, um estudo da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), produzido com base nos dados da Agência Nacional de Mineração (ANM) e do Serviço Geológico Brasileiro (CPRM), ambos órgãos do governo, mostrou que as falas do chefe do Executivo são enganosas. De acordo com a pesquisa, apenas 11% das jazidas de potássio da Bacia do Amazonas estão em terras indígenas.

Segundo o levantamento, sem considerar a Amazônia Legal – área na qual o presidente defendeu a exploração da mineração –, as reservas de potássio brasileiras podem sustentar o país até o ano de 2100.

Na visão de Castellano, interesses maiores do que jazidas de potássio explicam a vontade do presidente em apoiar a exploração em terras demarcadas, visto que o PL 191 libera, além da mineração, o garimpo. “Como estudos mostram que nessa região nem existe uma quantidade significativa de potássio, mas, sim, de ouro, fica evidente que, na verdade, o interesse é outro”.

 

Indígenas sob ameaça

Secretário Executivo do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), Antônio Eduardo Cerqueira de Oliveira explica que, além do PL 191, o Plano Nacional de Fertilizantes também tem se demonstrado prejudicial para as terras indígenas. “Em uma quantidade menor, o PLP pode trazer prejuízos principalmente para a região Norte do país, caso não contenha as salvaguardas necessárias para impedir a exploração de potássio, principalmente no entorno de terras demarcadas”, explica.

Na visão do indigenista, dentre os principais prejuízos para os povos originários, estão os culturais e ambientais, principalmente em relação aos mananciais.

“Assim como no PL 191, o PNF contribui para que os indígenas não tenham autonomia em decidir se querem ou não a exploração, que pode ser ou não realizada por indígenas, e coloca nesses territórios elementos que podem impactar na organização cultural, social e também nos costumes, levando prejuízos aos povos como trabalhado análogo a escravidão, prostituição, comercio de drogas e armamento”. Citação.

De acordo com Oliveira, o CIMI avalia que o PL 191 possui elementos inconstitucionais, já que no artigo 231 da Constituição Brasileira de 1988 as terras demarcadas são de uso exclusivo dos indígenas.

 

Expectativas para aprovação e mobilizações

Aprovado para votação em urgência na Câmara, o PL 191 conta com uma correlação de forças desfavorável aos povos indígenas. Até o momento, 279 deputados se mostraram favoráveis à sua aprovação.

O secretário do CIMI aponta que a situação só deve melhorar a partir das eleições. “Essa é uma situação que devemos avaliar para as próximas eleições, em como teremos esse suporte maior no Congresso Nacional, porque do jeito que está é totalmente desfavorável à luta, não só dos povos indígenas, como dos movimentos sociais, do meio ambiente e a tudo que se refere às políticas públicas ofertadas à população menos favorecida do Brasil”, conclui.

Na categoria petroleira, Castellano afirma que a FUP se posiciona contra a forma como o PLP está sendo colocado. “Não resolve a questão do gás e da indústria do petróleo, além de não definir quem vai executar as obras que estão paradas e deixa um espaço enorme para crimes ambientais e contra os povos originários”.