Greve em defesa da PBio é histórica na categoria Greve em defesa da PBio é histórica na categoria

Diversos, Notícias | 24 de junho de 2021

Confira balanço sobre a mobilização iniciada em 20 de maio de 2021. Apesar do envolvimento e da pressão, a Petrobrás e a PBio se negaram a responder ao principal pleito: a incorporação dos trabalhadores em caso de privatização. Categoria espera nova mediação no TST sobre os dias parados e pretende levar a luta para outras esferas

 

“A greve é uma tarefa dentro de uma luta maior, que é a defesa dos empregos, da usina, da agricultura familiar”, pondera Alexandre Finamori, coordenador do Sindipetro MG, ao começar um balanço da mobilização – já considerada pela categoria petroleira como “histórica” – dos trabalhadores da Petrobras Biocombustível, que começou dia 20 de maio. Neste momento, a greve está suspensa, enquanto aguarda-se uma mediação com o TST. 

O Sindipetro MG e o Sindipetro BA protocolaram, na quinta-feira (17), uma proposta para a ministra Delaíde Miranda Arantes, relatora do processo no TST, em relação aos dias de greve. Os sindicatos pedem a devolução imediata dos descontos feitos de 20 de maio a 03 de junho, assim como seus reflexos em relação aos dias de férias. Os sindicatos se comprometem a encerrar a greve, suspensa em 4 de junho, com a manutenção integral dos serviços. As partes pedem, com celebração do acordo, a extinção do dissídio coletivo de greve.

A empresa tem até o fim da semana para responder. Caso haja uma contra-proposta, uma nova audiência poderá ser marcada.  (Leia mais sobre a proposta dos sindicatos em relação ao abono dos dias de greve e outros aqui)

“Mesmo com uma greve histórica, a Petrobrás e a PBio se negaram a responder ao nosso principal pleito: a incorporação dos trabalhadores em caso de privatização, mesmo com a posição do Ministério Público do Trabalho (MPT) de que seria possível esse acordo”, critica Felipe Pinheiro, diretor do Sindipetro MG

Ele reforça que agora a luta segue em outras esferas, como no Judiciário e na articulação no Congresso, para tentar barrar a venda da PBio e garantir o emprego dos trabalhadores. 

Adesão massiva

A mobilização, conforme lembra Cibele Vieira, da Federação Única dos Petroleiros, contou com adesão massiva dos trabalhadores da usina de biodiesel Darcy Ribeiro, em Montes Claros, da usina de Candeias, na Bahia, e também dos trabalhadores do Rio de Janeiro.  

“A greve está de parabéns, a adesão das pessoas foi fantástica. É difícil ver uma adesão tão massiva, com os supervisores, e feita em um momento estratégico, antes de concretizar a venda, para ser possível abrir esse espaço de reflexão e negociação”, sublinha. 

Uma das conquistas que Cibele reforça é a participação da Petrobras Holding nas negociações. “A gente sabe que a empresa tem se negado cada vez mais a reconhecer o sistema Petrobras, que ela tem buscado tratar de forma separada as questões. E é uma luta constante nossa manter todas as subsidiárias, o acordo coletivo para a PBio, a Transpetro, para a Petrobras. Foi uma conquista fazer a Petrobras Holding ir para a negociação no TST, não ficar só na PBio”, explica.  “É um reconhecimento que ela tem que ser interlocutora com os trabalhadores da PBio, independente que o vínculo trabalhista deles seja com a subsidiária, a Petrobras Holding é dona da PBio. Isso a greve conseguiu marcar”, reforça.

Esse elemento também foi destacado por Antônio Renê de Sousa, técnico de operação concursado da PBio, que trabalha há dez anos na usina Darcy Ribeiro. “A Petrobras se sustenta numa falsa tese de que não somos trabalhadores da empresa, mas fazemos parte do sistema Petrobras”, destaca. Ele critica ainda essa postura de desprezo frente a centenas de pessoas com mão de obra qualificada, que passaram por concursos ou treinamentos diversos, além de terem experiência acumulada. 

Assim como Antônio, Lourinaldo Soares da Silva Júnior, transferido para MOC desde julho de 2011, também critica o processo de venda da usina, que pode significar prejuízos para diversos setores da sociedade. “Um modelo desse, se passar, será um laboratório para possíveis desinvestimentos nesses mesmos moldes. Pode gerar uma jurisprudência para privatizações sob esses mesmos parâmetros, nunca vistos na Petrobras antes”, pontua.  

Lourinaldo lembra o caso da usina de Quixadá, no Ceará, que está sem funcionar desde 2016, com muitas pessoas desempregadas até hoje. “Se fechar aqui também, podemos ter perda de centenas de empregos, diretos e indiretos”, diz. 

Modelo energético e desenvolvimento 

Além da falta de respostas sobre a situação dos trabalhadores – tanto os concursados como os terceirizados e os indiretos – a mobilização chamou a atenção para a importância de a Petrobras investir em outras formas energéticas, como o biodiesel, e com a preocupação com o desenvolvimento regional. 

Antônio Renê destaca a importância da compra de produtos da agricultura familiar, ainda que essa ênfase tenha diminuído nos últimos anos. Além do prejuízo para a própria Petrobras que, com a venda das usinas, perde investimentos em energia mais verdes, outro impacto para a região é na arrecadação de impostos e na venda de produtos. 

Lourinaldo reforça essa análise. “Temos cerca de 170 empregos diretos e vários indiretos, devido ao grande fluxo de transporte, carretos, de equipamentos, insumos, transporte de pessoas também.. Pessoas que vendem alimento, hotéis, postos de gasolina, envio de materiais. Terá um impacto muito grande o fechamento de uma unidade desse porte. Tem também um impacto ambiental, porque é uma empresa que se preocupa com a emissão de efluentes, por exemplo, segue procedimentos e padrões rigorosos,  algo que uma indústria privada pode minimizar”, diz. 

A questão da transição energética e a responsabilidade de uma empresa estatal é destacada por Cibele. “O mundo todo está discutindo como conciliar as necessidades humanas com o planeta, essa é uma questão colocada para nosso tempo. E a questão da transição energética é central nesse debate. A Petrobras entrou na área de biocombustível pensando na transição energética. A maior parte das petrolíferas do mundo está fazendo isso. Uma empresa ficar só no petróleo está encurtando seu tempo de vida e deixando de contribuir para o desenvolvimento de novas tecnologias”, alerta. 

“A PBio vem dentro de um contexto de uma preocupação ambiental, uma preocupação com o sistema de produção e do desenvolvimento regional. Quando se fala em vender a PBio, a Petrobras sair dessa discussão, está se falando em tornar a produção de biocombustível inteiramente no setor privado, que não tem uma preocupação mais ampla com o desenvolvimento, com o olhar para o futuro”, preocupa-se a dirigente da FUP.

Organização e próximos passos

Cibele acompanhou de perto a greve em Montes Claros. Todos os dias, às sete horas, uma reunião na porta da usina discutia os próximos passos. “Foi muito bonito ver a auto-organização também, as pessoas levando o café, os banquinhos, organizando a tenda. Quem faz o movimento são os trabalhadores e trabalhadoras, o sindicato está ali para ajudar a organizar, mas quem faz são os trabalhadores”, diz. 

Foi uma greve forte, com adesão total dos cargos de supervisão, parando a produção, foi uma greve expressiva, que servirá como um exemplo de engajamento da força de trabalho. Mostrou para a diretoria que estamos insatisfeitos e mostra a força do trabalhador contra esse desmonte que a Petrobras vem sofrendo há algum tempo”, complementa Lourinaldo. Ele destaca também a importância de ter envolvido a sociedade local na discussão, com diversos atos de rua e a realização de uma audiência pública na Câmara de Vereadores. A ALMG também debateu o tema, a pedido da deputada estadual Beatriz Cerqueira

Alexandre Finamori, coordenador do Sindipetro MG, reforça que alguns temas centrais da greve continuam em aberto, como a garantia do emprego e a transparência no processo. 

Lourinaldo critica a falta de vontade da empresa em negociar. “Em parte a gente sai com o gostinho que queria algo mais, mas é manter a força, manter a luta para ações futuras. Temos energia pra lutar, reivindicar, não só pelo nosso emprego, mas pelo futuro do Brasil”, argumenta. 

Por que defender a PBio?

A PBio é uma das maiores produtoras de biodiesel do país, e o Brasil é o terceiro maior mercado mundial desse biocombustível. A despeito disso, a subsidiária da Petrobrás vem sendo desmontada desde 2016, quando, no governo de Michel Temer, foi fechada a usina de Quixadá, no Ceará, interrompendo a produção de cerca de 100 mil metros cúbicos de biodiesel por ano. Além disso, a Petrobrás abriu mão da participação em diversas outras usinas. 

O processo de desmonte foi intensificado no governo de Jair Bolsonaro, que colocou à venda as usinas de Montes Claros (que tem capacidade produtiva de 167 mil metros cúbicos de biodiesel por ano) e de Candeias (que pode produzir 304 mil metros cúbicos), anunciando a saída da Petrobrás do setor de biocombustíveis, na contramão das grandes empresas de petróleo e gás natural do mundo. 

A venda da PBio foi anunciada em julho de 2020. Na ocasião, a Petrobrás destacava ao mercado que a empresa teria “um crescimento expressivo de 25% do mandato de mistura de biodiesel nos próximos três anos (B12 to B15), é porta de entrada e de expansão no terceiro maior mercado de biodiesel do mundo, tem localização estratégica, com acesso privilegiado aos mercados brasileiros das regiões Sudeste e Nordeste”, entre outros atributos. 

A privatização da PBio é contestada no Judiciário por meio de ações civis populares em Minas Gerais e na Bahia. Conflitos de interesses na privatização da PBio também foram alvos de denúncias na Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e no Tribunal de Contas da União (TCU).

Confira mais sobre o histórico de mobilização no site da FUP